Correntes que libertam
Quem é Bruna Uchôa? Uma moça pacífica. Mas há um modo de me irritar em um minuto. Peça para me perguntarem:
” O que você ganha com isso? ”
ou me dizerem a clássica :
” Os jogadores estão cheios de grana no bolso, e você aí se preocupando sem ganhar nada. ”
É o que você ouve quando um mané travestido de sensato tenta te convencer em meias palavras que você é um idiota. Não recrimino quem não gosta de futebol e expressa isso. Já dizia Voltaire: ”Posso não concordar com o que dizes, mas defenderei até a morte, o teu direito de dizer”. Eu só não admito quem não respeita quem gosta e não sabe formular comentários concisos sobre seu ponto de vista. Se dinheiro no bolso de jogador afastasse torcedor, o brasileirão seria no máximo um programa de TV.
Torcer não é uma questão apenas de escolha. É acima de tudo uma orientação espiritual. Você simplesmente não escolhe dormir em bancos de aeroportos e rodoviárias, incinerar a cara no sol enquanto espera horas na fila pelo ingresso, e ter um ataque de pelanca só de pensar em perder o jogo do Mengão. Se torcer fosse algo facultativo ninguém torcia pelo Vasco.
Não teve para onde correr. Um dia, em algum momento da sua vida, o Flamengo tocou você.
Você que aprendeu a amar o Flamengo porque o seu pai lhe abriu as portas para essa paixão. Você que contradisse a sua família quando ”escolheu” as cores do Flamengo ainda pequeno. Você que como eu, só precisou de um jogo para entender o propósito da sua vida sem duvidar.
Não importa a origem do seu amor. O que importa é que ele existe e necessita ser exercido. Quem ama quer estar perto, cuidar, preservar. Vislumbra o futuro, não esquece o passado. É capaz das maiores loucuras, não porque quer aplausos, mas sim porque atende um chamado do peito. Não dá chances para o pensamento técnico, pois esse não explica o que você sente quando o Flamengo joga uma decisão. Faz desse sentimento um estilo de vida, e não se preocupa se algum esperto das galáxias diz que você é ridículo. Isso tudo porque você sabe que quem não vive por algo, morre por nada.
Aquilo que vai percorrendo seu corpo, pulsando nas veias, querendo explodir dentro do peito. E não há explicação. Você é Rubro-negro por sentir isso, mas e isso… de onde vem? Eis a pergunta. Eis a questão.
O Flamengo é um bem de todos nós. Um bem material e imaterial. Que sempre será onipresente enquanto a Nação existir. O único bem que não precisa ser disputado e/ou repartido. Ele será sempre será inteiro para cada um de nós e de nossos descendentes. Um bem que faz bem dividir. Futebol para quem ama é magia, e amar o Flamengo não é um somente um fato, é algo que nos consome, que nos eleva, que nos torna escravos deste amor. E é este amor a maior herança que poderíamos deixar aos nossos filhos. Porque dinheiro é maravilhoso, mas pode se acabar, ser gastado ou roubado, mas o amor ao Flamengo é algo que nunca, em nenhuma dimensão deste Universo poderá se acabar. É algo maior, é algo sublime.
Por tudo isso vou levando esta vida de off Rio, dormindo em meio a milhares de escudos do Mengão e a recortes de jornal ( tiete total), aguentando toda essa falta que sinto do meu clube, quando passo certo tempo sem o ver de perto, e sentindo meu ser como que é Rubro e Negro, como que é total. Toda essa seiva, salva e vastidão. Transformando-me numa escrava que há muito já aceitou as correntes, pois sem elas, não estará livre. O amor liberta. E transforma: hoje sou poeta.
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