Zico, Rei divino

Eu não vi o Galinho jogar.

Nasci em 96 e ele já não trazia mais  a sua luz aos gramados. Cresci ouvindo que jamais veria algo semelhante e com a herança que ele tinha me deixado. E cresci doída nas tardes de domingo sem Zico (e nem a mim) no Maracanã. Cresci vibrando com o que há muito tinha se desenrolado,  coração infantil partido, ciente de ser súdita saudosa, clamando pelo Rei antiabsolutista. Me prostrava perante aos tapes, congelando em minhas retinas cada lance. Não haviam doces, folguedos ou passeios. Havia eu só, no chão da sala, me afogando em nostalgia no alto dos meus 11 anos.

Um dia eu acordei chorando, e abracei a minha mãe. Disse que eu não podia morrer sem ver o Zico, e ela precisava me compreender. A morte afinal, não era alheia as crianças, e eu precisava dizer ao Rei que eu tinha nascido novamente em 2007. Precisava agradecer seu legado. Precisava dar a minha palavra e garantir que eu zelaria pelo nosso Mengão – pra sempre.

Até hoje acredito que ele é algum tipo de divindade encarnada – é a única explicação para que até em sonhos você trave para falar com ele. Parece que nada do que você disser vai ser apropriado. Não é fácil empurrar pra fora nem mesmo um sincero “eu te amo”. Nem mesmo um “muito obrigado’’… a gente não se conforma com o silêncio que a alma emocionada tenta nos impor (algumas vezes ele vence), e treina para falar e parecer um súdito em momento solene, e por vezes vira uma criança estática defronte a um titã. E mesmo os que driblam essas sensações e proferem palavras cheias de nexo ao Galinho, tem depois uma noite perdida, envolta por uma paz tão inquietante, quanto as ondas equóreas.

A minha avó  mareja os olhos quando lembra da sensação de ver Zico entrando em campo. E toda vez que ela toca nesse assunto, a sua face rejuvenesce. O sorriso é franco, a fala mais entoada. Eu sei que nesse momento, ressuscita uma das melhores partes de sua juventude. Todo mundo volta no tempo falando do Rei. Todo mundo resgata o melhor de si com essa adoração genuína.

É fácil falar de Zico, difícil é expressar o que ele significa. Nasce um grito já endereçado ao entalo, nasce uma lágrima pra salgar com saudade as minhas doces palavras. Convido o meu bom senso para conter a minha emoção, e ele mesmo se emociona.

Agradeço, Zico. Pelas conquistas que herdei, pelas histórias que animam a minha avó, e pelas que Vossa Majestade me incentivou a buscar. A sua própria imagem é o único remédio, que trata e aumenta a úlcera funda que essa saudade causou. E sobre esse trecho, me desculpe não me fazer tão compreensível. É que o amor nem sempre o é….

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Tulio Rodrigues