Silvio Matos, CEO da Libra, tenta explicar briga com o Flamengo, mas cai em contradição

O imbróglio entre o Flamengo e a Libra ganhou novos capítulos após a entrevista do CEO da entidade, Sílvio Matos, ao jornalista Rodrigo Capelo, do Estadão. Na conversa, Matos contestou a postura do clube carioca na disputa judicial sobre a distribuição das receitas de televisão e defendeu a forma como o estatuto da Libra vem sendo conduzido. A declaração, porém, revela contradições e amplia o debate sobre transparência, governança e critérios técnicos dentro do projeto que promete remodelar o futebol brasileiro.
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O caso começou a se desenhar em fevereiro de 2025, quando o Flamengo, já sob a presidência de Luiz Eduardo Baptista (Bap), passou a ser representado na Libra por Marcelo Campos Pinto. As reuniões, que se estenderam de fevereiro a setembro, abordaram principalmente a revisão dos critérios de distribuição das receitas de TV, especialmente a fatia de 30% atrelada à audiência. Segundo Sílvio Matos, foram encontros técnicos e intensos, mas sem confrontos diretos. Ainda assim, a falta de consenso levou o tema a um impasse em agosto, culminando com a liminar obtida pelo Flamengo na Justiça, que bloqueou cerca de R$ 77 milhões de um pagamento da Globo os clubes.
Para Matos, a decisão foi “desproporcional”, já que a diferença que o Flamengo teria a receber, caso a nova regra fosse aprovada, seria de apenas R$ 1,6 milhão. Ele argumentou que o bloqueio “feriu o planejamento de outros clubes” e trouxe desconforto à associação. No entanto, o clube rubro-negro contesta essa narrativa. O Flamengo sustenta que a própria Libra já havia instruído a Globo a realizar pagamentos de forma irregular em julho, antes mesmo da liminar. O cerne da disputa está na interpretação do estatuto da Libra e na ausência de um critério formal para ponderar a receita de cada plataforma: TV aberta, fechada e pay-per-view.
Na entrevista, Matos tentou relativizar o problema, afirmando que o estatuto “foi feito antes de qualquer negociação de mercado” e que a Globo, por ser o único comprador, definiu seus percentuais de forma autônoma. O argumento, porém, entra em choque com o que consta no próprio documento da Libra, que prevê a necessidade de ponderação por plataforma, exigindo votação unânime dos clubes para qualquer mudança. A lacuna foi justamente o que o Flamengo apontou ao longo das discussões, cobrando que a entidade formalizasse a fórmula de cálculo.
A Libra chegou a elaborar cinco cenários para essa ponderação, e o Flamengo apresentou um sexto, incluindo o critério de “cadastro de torcedores” como métrica adicional. A proposta rubro-negra buscava atualizar o modelo, considerando dados de engajamento e consumo de conteúdo — algo que, segundo o clube, refletiria melhor o comportamento do torcedor moderno.
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O histórico das alterações estatutárias também reforça a tese de que mudanças não são novidade na Libra. Desde 2021, o documento passou por pelo menos cinco revisões, sendo duas delas voltadas especificamente à distribuição de receitas por audiência. Quando dizem que o Flamengo quer mudar as regras, é importante lembrar que a própria entidade já mudou várias vezes.
A divergência entre o discurso de Matos e os registros formais das assembleias acende um alerta sobre o processo decisório da Libra. Em abril, a Globo chegou a solicitar à entidade que informasse como deveria proceder nos pagamentos por plataforma, o que indica que nem mesmo a emissora tinha clareza sobre o método. Mesmo assim, a Libra enviou instruções sem a aprovação unânime exigida. O Flamengo, ao perceber a irregularidade, notificou formalmente a Globo e pediu que os repasses fossem suspensos até que o impasse fosse resolvido.
Outro ponto levantado por Matos é que a liminar teria “atrapalhado” o avanço das negociações entre Libra e Liga Forte União (LFU), que buscam a fusão das duas frentes de clubes. O dirigente chegou a dizer que o futebol brasileiro vive uma “botecalização”, em referência às discussões públicas e às divergências tornadas midiáticas. O argumento, porém, ignora o fato de que a própria fragmentação entre Libra e LFU nasceu da falta de consenso sobre o modelo de governança e a entrada de investidores.
O Flamengo, assim como Palmeiras e Corinthians, recusou-se a assinar o memorando de entendimento que amarraria os clubes a um investidor por dez anos (de 2029 a 2039). O trio entende que qualquer compromisso desse tipo, antes da criação formal da liga e da definição de regras transparentes, seria precipitado. Essa postura é vista por alguns dirigentes como prudência, e por outros, como resistência.
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A entrevista de Sílvio Matos, portanto, expõe não apenas a tensão entre o clube mais popular do país e a entidade que tenta consolidar a nova liga, mas também a fragilidade do próprio processo de estruturação da Libra. As divergências sobre critérios técnicos, a ausência de deliberação formal e a tentativa de resolver desacordos fora das instâncias adequadas alimentam a percepção de desorganização num projeto que nasceu com a promessa de profissionalizar o futebol brasileiro.
Enquanto a Justiça não decide o mérito da ação, o caso se arrasta entre interpretações estatutárias, versões divergentes e disputas políticas. A Libra tenta se firmar como o embrião da futura liga nacional, mas enfrenta o desafio de conciliar transparência, técnica e unidade.
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Por Tulio Rodrigues (@PoetaTulio)
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