ADVOGADOS ANALISAM RECURSO DE DEFESA DA LIBRA CONTRA O FLAMENGO: “FRACO E CONTRADITÓRIO”

Em meio ao impasse entre Flamengo e Libra sobre os critérios de rateio das receitas de transmissão do Campeonato Brasileiro, uma declaração acendeu o debate jurídico e político que ronda a formação da nova liga de clubes. “Pra mim, a Libra fraudou um documento”, afirmou o advogado Rodrigo Rollemberg em entrevista exclusiva, ao comentar as contradições entre a nota oficial divulgada pela entidade e o conteúdo do recurso apresentado no processo que corre sob sigilo judicial.
Ouça nossas análises e entrevistas sobre a eleição do Flamengo no seu agregador de podcast preferido: Spotify, Deezer, Amazon, iTunes, Youtube Music, Castbox e Anchor.
A polêmica ganhou corpo após a divulgação de um trecho do recurso da Libra pelo jornalista Diogo Dantas, do O Globo. O documento, que integra a defesa da associação no litígio com o Flamengo, expõe divergências entre o que a entidade declarou publicamente e o que consta formalmente em sua argumentação jurídica. O caso, embora envolto em tecnicalidades, toca em um ponto central: a forma como foi definido o critério de audiência que serve de base para o rateio financeiro entre os clubes.
Segundo o trecho revelado, a Libra afirma que o contrato com a Globo obedece aos critérios estabelecidos no Anexo 1 do estatuto da entidade, documento que detalha o cálculo de audiência para definir o percentual de cada clube. Esse anexo, porém, estabelece a soma do número de indivíduos que assistem aos jogos, e não de domicílios, como passou a ser aplicado pela consultoria Matos Projects, contratada para operacionalizar os pagamentos. “Se o anexo fala em indivíduos e a Matos Projects passou a medir por domicílios, o critério foi alterado. E se foi alterado, o documento precisaria ter sido retificado com unanimidade dos clubes. Isso não aconteceu”, explica Rodrigo.
O advogado sustenta que a suposta alteração de critério fere o próprio estatuto da Libra e, por consequência, torna inválido o rateio aplicado. “Mesmo que a Matos tivesse autonomia para calcular os valores, ela não poderia modificar o conteúdo do anexo. É uma mudança de natureza estatutária, e isso exige aprovação unânime. Se não há unanimidade, é nulo”, afirmou.
A cronologia ajuda a compreender o conflito. Em 6 de setembro de 2024, a assembleia da Libra aprovou o Anexo 1, que definiu os critérios de distribuição com base na audiência medida por indivíduos. Meses depois, em 7 de fevereiro de 2025, houve uma nova reunião, quando foi ratificada a contratação da Matos Projects para gerenciar o repasse das receitas junto à Globo. Ocorre que, segundo a própria defesa da Libra, “mantendo-se inalterado o Anexo 1”, a consultoria teria autonomia para “executar o contrato e realizar as apurações dos valores”. Para Rollemberg, o trecho é uma confissão. “Se o anexo foi mantido inalterado, não poderiam ter aplicado um critério diferente. Quando passam a medir por domicílios, estão contrariando o próprio texto que dizem ter preservado”, observa.
A LIVE COMPLETA:
A diferença entre medir por indivíduos ou por domicílios pode parecer técnica, mas tem impacto financeiro considerável. Em termos práticos, a contagem por domicílios reduz a audiência de clubes com maior alcance nacional, como o Flamengo, e beneficia equipes com concentração regional de torcedores. “Imagine uma casa com três televisões ligadas no mesmo jogo. Pela métrica de indivíduos, contam-se três espectadores. Pela de domicílios, conta-se apenas um. Isso muda toda a lógica de rateio”, detalha o Rodrigo.
O advogado vai além e afirma que o cenário aplicado pela Libra, chamado “Cenário 1”, não apenas alterou o parâmetro de medição como introduziu pesos diferentes para cada plataforma: 60% para TV aberta, 5% para fechada e 35% para pay-per-view, sem que esses percentuais tenham sido deliberados pela assembleia. “Da onde saíram esses números? Não existe aprovação unânime, nem registro em ata. É um critério criado de forma unilateral”, acusa.
A defesa da Libra, por outro lado, sustenta que o Flamengo foi o único clube a propor alteração do estatuto, tentando substituir o critério de audiência por outro formato. Essa tese, contudo, entra em choque com o próprio recurso judicial, que reconhece a manutenção do anexo original. “Eles se contradizem o tempo todo. Numa nota pública dizem que o Flamengo quis mudar as regras. No processo, admitem que o anexo se manteve inalterado. Não dá pra ser as duas coisas ao mesmo tempo”, rebate o jurista.
Para o advogado, a contradição deslegitima o argumento central da Libra. “Quando o contrato com a Globo é executado com base em um critério que não está no anexo, e esse anexo não foi modificado por unanimidade, há fraude documental. É disso que estou falando”, afirmou.
VEJA MAIS:
CASO PREFIRA OUVIR:
O caso corre em segredo de justiça porque envolve contratos comerciais com cláusulas de confidencialidade. Ainda assim, o debate jurídico transbordou para o campo público e político, refletindo a disputa de poder dentro do futebol brasileiro. O Flamengo, que desde o início defende uma liga com regras mais equilibradas e transparentes, vê na controvérsia um exemplo do que considera um vício estrutural da Libra: a falta de governança e de clareza na tomada de decisões.
Para Pablo Malheiros, o episódio é sintomático. “A Libra não tem coerência interna. Tenta justificar o injustificável com uma engenharia jurídica que não se sustenta. É como se quisessem validar uma deliberação que nunca aconteceu. Isso não é erro, é uma escolha”, conclui.
Enquanto o processo segue sob análise, a disputa entre Flamengo e Libra escancara a fragilidade do projeto de liga no país. Em vez de unir os clubes em torno de um modelo sólido de gestão e distribuição de receitas, o embate expõe o quanto a desconfiança e a falta de transparência ainda dominam o futebol brasileiro.
Veja outros vídeos sobre as notícias do Flamengo:
—
Por Tulio Rodrigues (@PoetaTulio)
+ Siga o Blog Ser Flamengo no Twitter, no Instagram, no Facebook e no Youtube.
Descubra mais sobre Ser Flamengo
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.