Boto fala em grandeza do Flamengo, Sormani xinga e o jornalismo esportivo afunda no ataque pessoal
A entrevista concedida por José Boto a um podcast em Portugal, na qual o dirigente do Flamengo comparou a pressão e a grandeza do clube com a do Palmeiras, acendeu mais um episódio de tensão fora das quatro linhas. A reação não ficou restrita ao debate esportivo. Ela expôs, de forma incômoda, o padrão de degradação do jornalismo esportivo brasileiro, onde a crítica frequentemente abandona a argumentação e escorrega para a agressão pessoal, sem qualquer consequência institucional.
Ouça nossas análises e entrevistas sobre a eleição do Flamengo no seu agregador de podcast preferido: Spotify, Deezer, Amazon, iTunes, Youtube Music, Castbox e Anchor.
Boto falou como dirigente de um clube que convive diariamente com um nível de cobrança raro no futebol sul-americano. Ao citar o caso do zagueiro João Vítor, do sub-17, alvo de ataques nas redes após uma atuação ruim, ele tentou ilustrar a diferença de pressão vivida por jovens atletas no Flamengo. O exemplo foi usado para sustentar a ideia de que a grandeza de um clube também se mede pelo peso que ele impõe a quem veste sua camisa. Houve ali uma comparação direta, incômoda, entre Flamengo e Palmeiras. Houve também um reconhecimento explícito de que, hoje, o rival paulista está à frente no trabalho de base.
A fala, ainda que discutível na forma, estava ancorada em um argumento esportivo. A reação de parte da imprensa, no entanto, seguiu outro caminho. Em vez de contextualizar, problematizar ou mesmo rebater com dados, optou-se pela desqualificação pessoal. Foi nesse ambiente que o comentarista Fábio Sormani mandou José Boto “à merda”, em um ataque frontal, sem mediação, sem filtro e sem qualquer preocupação com o papel que ocupa como jornalista.
O episódio não é isolado. Ele se encaixa em uma sequência de comportamentos que vêm sendo naturalizados no jornalismo esportivo nacional. Xingamentos, insinuações, ataques morais e julgamentos apressados passaram a ocupar o espaço que antes deveria ser reservado à apuração, ao contraditório e à análise histórica. Quando isso acontece, o debate deixa de ser sobre futebol e passa a ser sobre vaidade, militância seletiva e conveniência editorial.
O contraste salta aos olhos quando se observa o tratamento dado a situações semelhantes. Em episódios recentes, entidades representativas da imprensa se manifestaram com rapidez para repudiar declarações de dirigentes quando o alvo era uma jornalista ou quando o caso ganhava contornos politicamente sensíveis. No caso de Sormani, o silêncio foi absoluto. Nenhuma nota, nenhuma reflexão pública, nenhum incômodo institucional. A pergunta é inevitável: por quê?
LIVE COMPLETA:
A resposta passa pela cultura de permissividade que se instalou no setor. Jornalistas se sentem autorizados a ofender dirigentes, clubes e personagens do futebol sob o argumento de “opinião”, enquanto exigem postura exemplar quando o movimento ocorre no sentido contrário. A régua moral muda conforme o personagem, o clube envolvido e a narrativa que se deseja sustentar.
O mesmo padrão aparece em outros episódios recentes. Paulo Vinícius Coelho, o PVC, publicou uma coluna tratando a busca do Maracanã por gramado nível 4 da FIFA como “prova do fracasso” dos campos brasileiros, ignorando critérios técnicos básicos e induzindo o leitor ao erro. Em outra ocasião, colocou sob suspeita decisões do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro sem qualquer prova, atribuindo liminares inexistentes em favor de Ednaldo Rodrigues, ex-presidente da CBF. Os fatos mostraram o oposto. Ainda assim, não houve retratação proporcional ao impacto da informação falsa. Pelo contrário, vieram prêmios e homenagens.
Danilo Lavieri seguiu caminho semelhante durante a cobertura da Libra, publicando documentos de forma parcial e levantando suspeitas que não se sustentaram. Quando o Flamengo apresentou estudos técnicos à CBF sobre gramados sintéticos, atendendo a um pedido da própria entidade, a reação foi de deboche. Não houve a mesma indignação com a entidade, nem questionamento sobre por que outros clubes não enviaram material semelhante.
VEJA MAIS:
CASO PREFIRA OUVIR:
Esse conjunto de episódios revela um problema estrutural. O jornalismo esportivo brasileiro passou a operar em lógica de trincheira. Quem questiona é taxado de militante. Quem erra é protegido pelo prestígio acumulado. Quem ofende é tratado como “passional”. O debate técnico, histórico e ético fica em segundo plano.
A fala de Boto pode e deve ser criticada. O tom, a escolha das palavras e a comparação direta alimentam rivalidades desnecessárias. Mas nada disso justifica o rebaixamento do debate ao nível do xingamento. Quando um jornalista abandona o argumento e parte para a agressão, ele não está defendendo o futebol. Está apenas confirmando a falência do próprio discurso.
O que está em jogo não é Flamengo contra Palmeiras, nem Boto contra Sormani. É a credibilidade de um jornalismo que cobra profissionalismo, mas se recusa a praticá-lo quando o alvo é conveniente. Enquanto não houver autocrítica, a pergunta seguirá ecoando: quem fiscaliza os fiscais?
Jornalistas atacam posts do Flamengo zoando Palmeiras e Sormani ofende Bap
Veja outros vídeos sobre as notícias do Flamengo:
—
Por Tulio Rodrigues (@PoetaTulio)
+ Siga o Blog Ser Flamengo no Twitter, no Instagram, no Facebook e no Youtube.
Descubra mais sobre Ser Flamengo
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.