O debate sobre o tipo de gramado utilizado no futebol brasileiro ganhou novo capítulo nesta semana, quando o Flamengo protocolou junto à CBF um estudo técnico pedindo a padronização dos campos do país e a eliminação gradual dos sintéticos. A iniciativa surgiu nesta segunda (8), quando o clube entregou um documento de 25 páginas ao grupo de trabalho que será criado para discutir o tema. A reação veio de São Paulo, onde a presidente do Palmeiras, Leila Pereira, respondeu com críticas diretas à proposta. O episódio expôs como o assunto, embora tenha natureza técnica, acabou capturado por disputas políticas pela dirigente.
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O estudo apresentado pelo Flamengo foi elaborado por profissionais de diferentes áreas e reúne dados, referências científicas e parâmetros adotados por ligas da Europa e da América do Sul. O texto defende que o tipo de superfície é determinante para a jogabilidade, a segurança dos atletas e a isonomia competitiva. Segundo o documento, a forte variação entre os gramados nacionais, naturais, híbridos e sintéticos, provoca distorções técnicas que não combinam com competições de alto nível. Além disso, o clube aponta que nenhuma das principais ligas europeias permite o uso de sintéticos e que, na atual temporada, não há registros desse tipo de campo na primeira divisão de Argentina, Uruguai ou Colômbia.
O estudo dedica parte importante ao impacto médico e físico das superfícies artificiais. Cita pesquisas que relacionam rigidez excessiva a lesões ligamentares, queimaduras por atrito e elevação de temperatura que pode ultrapassar a marca dos trinta graus em relação ao natural. Jogadores consagrados já se manifestaram sobre isso. Messi condicionou seu calendário nos Estados Unidos à retirada de gramados sintéticos em alguns estádios. No Brasil, há anos atletas relatam desconforto, e alguns chegam a recusar a atuação em determinadas arenas. O Flamengo argumenta que esse cenário afeta a capacidade de atrair nomes de projeção internacional.
O documento também se aprofunda no comportamento da bola. A velocidade dos passes, a absorção do impacto e a diferença no quique vertical alteram o estilo das partidas, favorecendo menos o jogo de fricção e mais a circulação rápida. Para medir essas variações, o clube propõe adoção obrigatória de testes utilizados pela FIFA e pela UEFA, como rolagem da bola, absorção de impacto, rigidez da superfície e tração. O estudo sugere ainda a criação de um protocolo permanente de avaliação para liberar estádios em competições organizadas pela CBF.
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Outro ponto central é a transição. O Flamengo não propõe retirada imediata dos sintéticos. A ideia é substituí-los na Série A até o fim de 2027 e, na Série B, até 2028. Durante esse período, os campos artificiais teriam de obedecer a padrões mínimos: altura da fibra, densidade, tipo de preenchimento, camada de amortecimento e coloração. O texto também estabelece critérios rígidos para gramados naturais, incluindo controle de irrigação, drenagem e manutenção. A meta é que, a partir de 2026, qualquer estádio apresente comportamento uniforme na interação bola-superfície e atleta-superfície.
Quando o estudo se tornou público, a presidente do Palmeiras reagiu imediatamente afirmando que as alegações do Flamengo seriam “fake news”. Leila disse que não há comprovação científica sobre maior risco de lesões em superfícies sintéticas e que o clube carioca só poderia opinar sobre gramados quando tivesse estádio próprio. Citou ainda que, segundo ela, o Palmeiras está entre os times com menos lesões na Série A desde a instalação do sintético no Allianz Parque.
A resposta, porém, ignorou pontos centrais do documento e gerou críticas. O estudo do Flamengo não menciona Palmeiras ou qualquer outro clube. Discussões sobre padronização de gramados não tratam de estádios específicos, mas do ambiente estrutural do futebol brasileiro. Além disso, ao ligar a proposta a uma rivalidade direta, a dirigente personalizou uma discussão que, no texto original, é conduzida de forma ampla.
Horas mais tarde, o presidente do Flamengo, Luiz Eduardo Baptista, o Bap, comentou o tema em evento da CBF. Ele reafirmou que o clube defende a eliminação do gramado de plástico por considerar que não é compatível com o nível de competitividade desejado. Afirmou ainda que quem pretende explorar estádios prioritariamente com shows deveria buscar outro ramo e que o futebol brasileiro não precisa seguir práticas de países com inverno rigoroso, contexto no qual o sintético foi inicialmente aceito pela FIFA.
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A discussão, que começou técnica, derivou para o campo político, e isso não é novidade. O episódio lembra a disputa recente envolvendo a Libra, quando divergências sobre regras internas e compromissos assumidos acabaram transformadas em disputa pessoal. O Flamengo argumenta que tenta discutir modelos e critérios. A reação de alguns dirigentes, por outro lado, insiste em enquadrar tudo como rivalidade isolada.
Enquanto o grupo de trabalho da CBF não é formalizado, o estudo segue disponível para análise pública. Independentemente da posição de cada clube, o debate exige leitura cuidadosa e argumentos fundamentados, porque trata da estrutura sobre a qual o futebol brasileiro tenta construir uma competição mais moderna e menos vulnerável às condições dos estádios.
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Por Tulio Rodrigues (@PoetaTulio)
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