Gramados de plástico: diretor do Flamengo revela que nenhum clube enviou estudo à CBF
A discussão sobre os gramados no futebol brasileiro ganhou contornos bem mais profundos do que aparentava à primeira vista. O que parecia apenas mais um embate retórico entre clubes virou um debate estruturante depois que um diretor do Flamengo revelou, com documentos e cronologia, que a CBF solicitou formalmente sugestões técnicas a todos os clubes para embasar um novo regulamento. O clube rubro-negro respondeu. Outros, ao que tudo indica, preferiram o caminho das notas políticas e do discurso público.
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A origem do tema remonta a novembro, quando a CBF levou para discussão três pilares considerados estratégicos: arbitragem, fair play financeiro e padronização dos gramados. Não se tratava de uma consulta informal nem de uma ação isolada. Os clubes foram convidados a enviar propostas técnicas, estudos e parâmetros que pudessem orientar uma eventual mudança regulatória. Dentro desse processo, o Flamengo apresentou um documento extenso, com mais de 20 páginas, detalhando custos, impactos esportivos, exigências de manutenção e prazos de transição.
Em entrevista recente, o diretor estratégico Alexandre Rangel, responsável por conduzir o tema internamente, explicou que a narrativa de que o Flamengo estaria tentando obter vantagem econômica simplesmente não se sustenta. Pelo contrário. Segundo ele, se o objetivo fosse economizar ou preservar interesses imediatos, o clube não teria interesse algum em elevar o padrão do Maracanã. “O Flamengo é um dos clubes mais impactados financeiramente por esse modelo. Jogamos cerca de 70 partidas por ano em um estádio que precisaria atingir padrão UEFA/FIFA nível máximo. Isso significa mais tecnologia, mais irrigação, mais iluminação, mais trocas completas de gramado e um custo muito superior ao da maioria dos estádios do país”, afirmou.
Os números ajudam a dimensionar o argumento. Enquanto a maioria dos clubes atua em arenas com cerca de 30 a 35 jogos por temporada, Flamengo e Fluminense dividem o Maracanã, o que dobra o desgaste do campo e exige um investimento contínuo muito acima da média. Ainda assim, a proposta apresentada pelo clube carioca não parte de uma lógica punitiva nem imediatista. O estudo sugere uma transição gradual, entre dois e três anos, inspirada em experiências internacionais, como a da Holanda, onde a migração para padrões mais elevados levou mais de três temporadas.
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A fala do dirigente também desmonta outro ponto recorrente no debate: a ideia de que gramados sintéticos seriam uma solução mais barata e eficiente. De acordo com ele, a conta não fecha quando se considera o custo total do futebol profissional. “Quando você soma impacto físico no atleta, risco de lesão, perda de performance e manutenção diária, a economia simplesmente não existe. Em muitos casos, o clube está perdendo dinheiro e rendimento esportivo”, disse.
Nesse contexto, chama atenção a ausência de transparência de clubes que lideraram o discurso contrário. Se a CBF pediu contribuições técnicas, onde estão os estudos apresentados por Palmeiras, Atlético Mineiro, Botafogo ou Athletico Paranaense? A pergunta não é retórica. Ela expõe uma diferença clara entre participar do debate institucionalmente e falar apenas para a plateia. Como lembrou o dirigente rubro-negro, no debate sobre fair play financeiro ocorreu algo semelhante: Flamengo e Corinthians enviaram propostas formais, muitas delas posteriormente incorporadas pela CBF, enquanto outros preferiram criticar o processo à distância.
O contraste também se reflete na postura pública. Em vez de confrontar dados, parte da imprensa optou por adotar narrativas prontas, algumas delas replicando termos e enquadramentos usados por dirigentes contrários à proposta. Quando um comentarista chama gramados naturais de “buraco” ou “pasto” e, dias depois, clubes utilizam exatamente a mesma linguagem em notas oficiais, a coincidência deixa de parecer casual.
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No fundo, o debate sobre gramados expõe algo maior: a dificuldade histórica do futebol brasileiro em lidar com pautas estruturantes de forma técnica, coletiva e transparente. O estudo apresentado pelo Flamengo não pretende ser um ponto final, mas um ponto de partida. Ele reconhece limites, custos e prazos, e convida os demais clubes a fazerem o mesmo. A pergunta que permanece é simples e incômoda: quem está disposto a discutir o futuro do jogo com dados e quem prefere apenas preservar interesses imediatos, mesmo que isso signifique manter o futebol nacional na mesma prateleira de sempre.
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Por Tulio Rodrigues (@PoetaTulio)
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