Como a imprensa paulista está vilanizando o Flamengo e Filipe Luís. Há um método claro; confira

O empate entre Flamengo e Palmeiras, no último domingo (19), ultrapassou as quatro linhas. O jogo, disputado no Maracanã, reacendeu um debate que há tempos se arrasta no futebol brasileiro: a seletividade com que parte da imprensa trata determinados clubes e personagens. O que começou com uma discussão sobre arbitragem transformou-se em um retrato de como se constrói, e se alimenta, uma narrativa de vilanização.
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O episódio mais emblemático veio de André Kfouri, colunista e filho de Juca Kfouri, que afirmou ter havido “dano maior ao resultado final” no duelo entre Flamengo e Palmeiras do que no clássico paulista de duas semanas antes. O argumento baseava-se em um suposto pênalti de Jorginho em Gustavo Gómez, ainda no início da partida. O problema não estava apenas na opinião, legítima por natureza, mas na comparação: ao tratar o lance como um escândalo, ignorou o histórico de lances similares em outros jogos, inclusive envolvendo o próprio Palmeiras, que raramente receberam o mesmo peso de análise.
O que se vê, de forma cada vez mais evidente, é um padrão de interpretação conveniente. Quando o Flamengo é supostamente beneficiado, a manchete ganha contornos de denúncia: “A arbitragem empurra o Flamengo à vitória”, escreveu Juca Kfouri. Quando o favorecido é o Palmeiras, o tom muda: “Virada histórica do Palmeiras faz velório no Morumbi”. A arbitragem, nesse caso, deixa de ser protagonista. A diferença não é apenas de enfoque, é de intenção narrativa.
Felipe Luís, treinador do Flamengo, tocou num ponto sensível ao dizer que o Palmeiras “é o time que menos pode reclamar de arbitragem”. A frase, ponderada e objetiva, bastou para que André Rizek reagisse com ironia: “Por que o Palmeiras não pode reclamar? Só o Flamengo pode?”. A pergunta, feita em tom de indignação, ignorou um histórico farto de protestos palmeirenses: da Leila Pereira ao auxiliar de Abel Ferreira. Em 2016, o então presidente Paulo Nobre chegou a convocar uma coletiva para acusar a arbitragem de “tentativa de manipulação” após um lance regular em um FlaxFlu. Desde então, cada derrota vira combustível para novas queixas, o que não impede o clube de ser tratado, por parte da mídia, como exemplo de equilíbrio.
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Há um contraste gritante entre o que se exige do Flamengo e o que se aceita de outros. Quando o time carioca questiona decisões, é rotulado de arrogante ou conspiratório. Quando o Palmeiras faz o mesmo, ganha o selo da indignação legítima. O fenômeno, como observou o jornalista André Rocha, é um processo sistemático de “vilanização”. Ele começou, segundo ele, quando o Flamengo anunciou o maior contrato de patrocínio master do país, reacendendo um incômodo que transcende o futebol: a desconfortável percepção de que o clube mais popular também se tornou o mais poderoso.
O caso Bruno Henrique é outro exemplo de como a balança moral varia conforme o escudo. O atacante rubro-negro foi punido por uma infração leve e rapidamente comparado, em programas esportivos, a jogadores envolvidos em manipulação de resultados e recebimento de propina. A equivalência era falsa, mas eficaz: servia para reforçar a ideia de que o Flamengo está sempre ligado a algo “suspeito”. O detalhe jurídico, a diferença entre os artigos aplicados e as provas de cada caso, foi ignorado, porque a narrativa já estava montada.
A seletividade se repete na cobertura da Libra, onde jornalistas como Paulo Vinícius Coelho associaram decisões do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro a “liminares favoráveis a dirigentes”, insinuando um padrão inexistente. As insinuações ganharam eco, mesmo sem qualquer base factual, e criaram um pano de fundo que associa o Flamengo a bastidores nebulosos sempre que o tema envolve poder e influência.
A ironia é que, dentro de campo, foi o Palmeiras quem aperfeiçoou o “método”. O antijogo, a pressão sistemática sobre árbitros, as simulações e o teatro ensaiado de atletas como Gustavo Gómez formam uma estratégia tão previsível quanto eficaz. A cada lance duvidoso, o time paulista cria o ambiente para a dúvida. E a dúvida, no futebol brasileiro, sempre beneficia quem grita mais alto.
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O jogo no Maracanã, portanto, não foi apenas mais um capítulo da rivalidade recente entre Flamengo e Palmeiras. Foi o espelho de um debate mais profundo sobre a forma como o futebol é contado, e por quem. A imprensa, que deveria sustentar o olhar crítico, tornou-se parte do jogo ao escolher lados e construir enredos. O problema não é a opinião, mas o desequilíbrio.
O que se discute, no fim, não é o possível pênalti de Jorginho em Gustavo Gómez, nem a legitimidade das queixas de Abel Ferreira. É a diferença de peso com que cada episódio é tratado. Um clube é constantemente julgado como culpado por princípio; o outro, tratado como vítima mesmo quando recorre aos mesmos expedientes. E quando a imprensa transforma o Flamengo no vilão de todos os enredos, o futebol perde o que deveria ser mais sagrado: a imparcialidade do olhar.
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Por Tulio Rodrigues (@PoetaTulio)
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