Runco x De la Cruz: o que a ética médica diz sobre o caso que abalou o Flamengo

Runco x De la Cruz: o que a ética médica diz sobre o caso que abalou o Flamengo
Imagem: Reprodução/Charla Podcast

O médico José Luiz Runco voltou a comentar, em entrevista recente ao Charla Podcast, o episódio que marcou sua saída do departamento médico do Flamengo no início da temporada. Ele explicou por que enviou, num grupo de WhatsApp, informações clínicas sobre Nicolás de la Cruz, revelando limitações estruturais nos joelhos do jogador, o que provocou reação imediata do clube, críticas públicas e risco de processo. A discussão reaparece agora porque o profissional tenta contextualizar a atitude como um “parecer técnico” enviado a outro médico, enquanto especialistas lembram que a relação médico-paciente é protegida por sigilo legal e ético, independentemente do canal utilizado ou do destinatário.


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A conversa retomou um fato conhecido. Em janeiro, logo após a eleição que levou Luiz Eduardo Baptista à presidência, Runco foi contratado para liderar uma reestruturação ampla na área médica. Meses depois, diante das dificuldades de De la Cruz em ter uma sequência de jogos, começaram a surgir indagações de torcedores em grupos de WhatsApp. Um pediatra, também rubro-negro, perguntou ao Dr. Runco se o problema físico do uruguaio justificava a reincidência de lesões. A resposta que deveria ter sido privada acabou enviada a um grupo.

Nesse texto, Runco afirmava que os joelhos do atleta eram “bichados” e que ele dificilmente conseguiria ter alta regularidade no alto rendimento. O conteúdo rapidamente se espalhou, gerando desconforto no elenco, Arrascaeta chegou a demonstrar apoio ao companheiro, e preocupação dentro do clube. De la Cruz não se manifestou diretamente, mas publicou mensagens interpretadas como reação ao vazamento. O Flamengo precisou agir, e a diretoria optou pela demissão do médico, considerada a saída mais rápida para estancar o episódio.

Runco, ao revisitar o caso, sustenta que se tratava de um comentário restrito a um colega de profissão. Ele argumenta que estava apenas oferecendo um parecer, sem intenção de expor o atleta. Segundo ele, “a resposta era técnica” e foi parar no grupo por engano. O problema é que a relação entre confidencialidade e troca profissional não se resume a boa intenção. A legislação brasileira e o Código de Ética Médica tratam o sigilo como obrigação permanente. A divulgação de informações clínicas só ocorre com consentimento expresso do paciente, por ordem judicial ou em situações em que exista risco à saúde pública, nenhum desses requisitos estava presente na conversa sobre De la Cruz.

Mesmo quando outro médico solicita esclarecimentos, a norma exige registro da comunicação no prontuário e justificativa clara. Essa proteção vale também para diagnósticos, prognósticos, tratamentos e limitações físicas. O jogador, portanto, permanece resguardado mesmo em diálogos privados. Ao levar dados sensíveis para o ambiente instável de grupos digitais, ainda que composto majoritariamente por médicos, o risco de vazamento se torna evidente. E foi exatamente o que aconteceu.

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Do lado esportivo, a história ganhou outro contorno conforme a temporada avançou. De la Cruz voltou a se ausentar dos jogos com frequência. Parte da torcida passou a interpretar a fala de Runco como premonitória, mas isso não altera o ponto central: a veracidade clínica não torna ética a forma como a informação se tornou pública. O debate, portanto, deixa de ser sobre a gravidade do problema físico do jogador e passa a tratar da responsabilidade que médicos têm ao lidar com dados pessoais.

O próprio Runco reconhece que a repercussão tornou sua permanência insustentável. Segundo ele, o clube pediu acordo, o que interpretou como admissão implícita de culpa, razão pela qual recusou. A demissão veio logo depois. O episódio mostrou que, mesmo no futebol, em que médicos lidam com pressões externas e curiosidades constantes sobre a condição dos atletas, há fronteiras que não podem ser atravessadas.

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A discussão ética que emerge desse caso vale para além do Flamengo. Em tempos em que conversas internas vão para fora com facilidade, clubes e profissionais precisam reforçar protocolos, orientar departamentos e estabelecer regras claras sobre como informações médicas são compartilhadas. A privacidade do atleta não é acessório: é direito. E sua preservação exige disciplina até no ambiente mais informal.

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Por Tulio Rodrigues (@PoetaTulio)

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Tulio Rodrigues

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