Depois do Tri Carioca, entre outras conquistas, o Flamengo marcou definitivamente seu nome no cenário nacional e internacional. Foram muitos títulos seguidos que alimentaram novas ambições e metas nos anos seguintes. Era necessário conquistar um Brasileiro, disputar bem uma Libertadores… Era preciso colocar o Flamengo no topo do mundo.
O elenco e a diretoria sabiam que não bastava ser considerado o melhor time; era preciso provar isso, vencendo os melhores campeonatos. E assim aconteceu, com classe, raça e muita luta. Zico descreve um pouco do que foi aquele primeiro Brasileiro. Na emoção do título, ainda no gramado, ele revelou que, desde sua contusão contra o Coritiba, não conseguia dormir direito. Acordava assustado, sonhando com lances, ouvindo a torcida cantar e até se via correndo para comemorar um gol. Foi uma semana de angústia para o Galinho. A conquista daquele título foi movida pelo coração, pela coragem e pelo amor à torcida que o fazia chorar. Esse foi o sentimento de Zico ao conquistar o Brasil pela primeira vez.
Depois de tantas conquistas históricas, qualquer um poderia dizer que não era preciso mais nada para entrar na história. Mas o céu era o limite para o Flamengo de Zico. Como se contentar sem antes conquistar o mundo? Com vinganças, o surgimento de novos ídolos, ladrilheiros, troca-troca de técnicos, superação, choros mineiros, socos, sangue e muita luta, ainda precisava chegar o mágico ano de 1981 — o ano mais rubro-negro e dourado da nossa história. E, claro, Zico seguia liderando o poderoso esquadrão.
Um dos problemas enfrentados pelo time foi a constante troca de técnicos, que deixava os jogadores confusos, sem um padrão ou organização tática. Era preciso trazer alguém respeitado pelos jogadores e com disciplina. Assim, a vontade de todos foi atendida, e Carpegiani assumiu o comando no final de julho. Aos poucos, ele corrigiu os problemas e colocou cada jogador no seu devido lugar. O Flamengo passou a ter uma liderança em campo e outra fora dele. Dois maestros de técnica e classe levaram aquele celeiro de craques ao topo do mundo.
Fora de campo, os dois também seriam influentes em uma das conquistas daquele ano. Zico conta que apenas uma vez na vida sugeriu uma mudança ao treinador: a saída de Baroninho para a entrada do experiente Lico na ponta-esquerda, que pela primeira vez seria titular. Raul, Leandro, Figueiredo, Mozer e Júnior; Andrade, Adílio e Zico; Tita, Nunes e Lico. Com exceção do saudoso Figueiredo, que nos deixou tragicamente em 1984, essa foi a formação campeã do mundo. E a estreia foi com um cartão de visitas inesquecível: 6 a 0 no Botafogo, a vingança que Zico e a torcida tanto desejavam. Aquela derrota que Zico presenciou aos 19 anos finalmente teve uma resposta à altura.
Pouco tempo depois, chegou o capítulo final da conquista da América. Duas semanas após a vingança no Maracanã, veio a revanche em Montevidéu. O time não contou com Lico, que não se recuperou da violência do Cobreloa. Leandro foi deslocado para o meio-campo, e Adílio virou ponta-esquerda. Antes do jogo, Nunes jurou que pegaria Mario Soto, mas, curiosamente, foi ele quem saiu no fim para a entrada de Anselmo… O soco que lavou a alma da Nação. E o jogo? Zico, como sempre, resolveu na bola, com sua classe interminável.
Menos de duas semanas depois, lá estava o Flamengo em mais uma final. Porém, uma péssima notícia abalou o time: faleceu Coutinho, o mestre que formou aquele grupo. Em meio a um turbilhão de acontecimentos, os jogadores tiveram que secar as lágrimas rapidamente, pois no dia seguinte enfrentariam o Vasco na decisão. Abatido, o Flamengo perdeu os dois primeiros jogos, mas não desistiu. Com muita luta — e a ajuda de um certo ladrilheiro —, conquistamos o título. A torcida fez a festa, e o ladrilheiro ganhou de presente o Manto Sagrado.
Na semana seguinte, mais um título estava em disputa. Não era apenas mais um: era o caneco que eternizaria o Flamengo de Zico na história do futebol mundial. No dia 13 de dezembro de 1981, a maior torcida do mundo celebrou com orgulho o título de maior time do planeta. O Liverpool, com oito títulos nacionais e internacionais nos cinco anos anteriores, e base da seleção inglesa, não viu a cor da bola. Kenny Dalglish? Deus dos Reds? Ninguém viu. O verdadeiro Deus naquela tarde se chamava Arthur, o Galinho que vestia a 10 e encantava com seus lançamentos milagrosos.
Após o jogo, o capitão inglês declarou que, em todos os anos jogando futebol, nunca havia visto um time tão diabólico. Aquele Flamengo enfrentou laranjas chilenas, socos de pedra e cachorros ferozes para chegar ali. Mesmo exaustos e abalados pela trágica morte do mestre Coutinho, nosso amado Mengo demonstrou frieza e leveza em campo. Aquele time mereceu o topo do mundo.
Nos dois anos seguintes, o Flamengo ainda conquistou mais dois Brasileiros. Com raça, luta, técnica e até profecias, Zico abençoou Nunes para o gol decisivo na campanha do bi. No tri, apesar de desafios como lesões e ausências, o time superou as adversidades e garantiu mais uma conquista histórica.
De 1978 a 1983, além de outros torneios, ganhamos cinco Taças Guanabara, quatro Estaduais, três Brasileiros, uma Libertadores e um Mundial, todos sob a liderança de Arthur Antunes Coimbra. Zico ainda conquistaria outros títulos pelo Flamengo, mas precisava de mais? Ele é o Rei dos nossos anos rubro-negros dourados.
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Agradeço ao Túlio Rodrigues pelo convite para fazer essa homenagem ao Galinho. Também agradeço pela amizade, carinho e respeito que ele sempre teve comigo, com seus amigos e leitores. Além de ser um rubro-negro apaixonado, Túlio é uma pessoa muito humana. Obrigado, amigo! Grande abraço!
Renato Croce é colunista do site Magia Rubro-Negra e dono do blog FlaManolos.
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