Flamengo pode mudar o futebol brasileiro ao financiar seu estádio próprio
O Flamengo decidiu trilhar um caminho que nenhum outro clube brasileiro ousou seguir na era das arenas modernas: construir um estádio totalmente financiado com recursos próprios. A decisão, confirmada na última reunião do Conselho Deliberativo, coloca o clube diante de um desafio bilionário. Se o plano for executado como projetado, será o primeiro grande estádio do país desde 2012 erguido sem dinheiro público, sem empréstimos do BNDES e sem a dependência de uma parceria com empresas privadas para dividir riscos e lucros.
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A inspiração para essa reflexão, surgiu após um post de Walter Monteiro no X (antigo Twitter), que chamou atenção para um detalhe revelador: o Flamengo pretende desacelerar o cronograma de obras para se capitalizar e, assim, garantir o autofinanciamento do projeto. “Será preciso muita disciplina para formar essa reserva”, escreveu, apontando o que considera uma ruptura de paradigma no futebol brasileiro.
Desde 2012, quando o ciclo da Copa do Mundo deu origem a uma leva de arenas, nenhum estádio foi erguido sem aporte público, endividamento de clubes ou a presença de parceiros privados. Exemplos não faltam. O Mané Garrincha, em Brasília, e a Arena da Amazônia, em Manaus, custaram bilhões aos cofres públicos e hoje sobrevivem como elefantes brancos, dependentes de jogos esporádicos e eventos isolados. Já o Mineirão e a Fonte Nova seguiram o modelo das parcerias público-privadas (PPP), em que governos bancaram parte substancial da obra e transferiram a gestão para consórcios privados.
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Houve ainda o caso do Beira-Rio e do Allianz Parque, em que empresas assumiram integralmente o financiamento em troca da exploração comercial. No modelo palmeirense, por exemplo, a W Torre investiu cerca de R$ 630 milhões para construição e recebeu o direito de gerir a arena por 30 anos. O resultado entregou ao clube um estádio moderno sem endividamento direto, mas trouxe restrições: perda de autonomia na agenda, disputas sobre receitas e até situações curiosas, como jogos disputados com arquibancadas interditadas por causa da montagem de palcos para shows.
O Corinthians seguiu por outro caminho: financiou sua arena com empréstimos do BNDES e incentivos fiscais. O custo inicial, estimado em R$ 820 milhões, superou R$ 1 bilhão. A dívida permanece pesada e compromete receitas do clube até hoje. Mesmo beneficiado por isenções tributárias e facilidades criadas pelo governo para os estádios da Copa, o clube paulista amarga um fluxo de caixa sufocado e litígios envolvendo a obra.
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O Flamengo busca se afastar desses exemplos. O custo do seu estádio é estimado em R$ 2,2 bilhões apenas na construção. A ideia é bancar tudo com a venda de ativos, como o potencial construtivo da Gávea, avaliado em R$ 195 milhões pela FGV, além da criação de uma poupança mensal a partir de 2026. O clube também prevê explorar receitas futuras do estádio como naming rights, camarotes e cadeiras cativas. A capacidade projetada é de 72 mil lugares.
O caminho, porém, está longe de ser simples. O terreno carrega entraves burocráticos e ambientais. A área industrial exige descontaminação do solo, processo estimado em até dois anos. 55% do espaço ainda é ocupado pela Naturgy, empresa de gás que precisará realocar suas operações, um processo caro e que pode levar até quatro anos.
CASO PREFIRA OUVIR:
No centro dessa equação está a solidez financeira construída nos últimos anos. A saúde econômica que permitiu ao Flamengo sonhar com esse projeto é, ao mesmo tempo, a garantia e o desafio. O clube que se acostumou a disputar títulos dentro de campo agora se prepara para uma disputa fora dele, talvez a mais ousada de sua história: provar que é possível erguer uma arena de padrão mundial sem se apoiar em governos, bancos públicos ou parceiros privados.
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Por Tulio Rodrigues (@PoetaTulio)
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